sábado, 13 de julho de 2013

"ENQUANTO O ESPAÇO NÃO NOS RECUPERA" - Soares Teixeira

Enquanto o espaço não nos recupera, recuperemos - a cada amanhecer - o perfume do trigo que somos. Chegará o dia em que sacudiremos os nossos ramos e não os veremos, Olharemos depois o nosso corpo, espantados, e perguntaremos pelas crinas, pelas asas, pelas ondas, pela chuva, pelo vento, pelo vulcão; por tudo aquilo que era a nossa matéria. E agora? Perguntaremos ao nos vermos despojados da metamorfose do quotidiano e do sentir. E agora? Que sou eu sem corpo? Sem aquele corpo que me fazia ser múltiplo, não apenas em pensamento. E agora? Os ossos; a carne; a pele; o gesto e o gosto da vontade concretizada, onde estão? Enquanto o espaço não nos reclama, reclama-nos a intimidade de tudo o nos observa, como se fossemos uma porta por onde é suposto entrar. Cumpre-nos saber abrir essa porta e saber fechá-la – consoante as circunstâncias. É certo que a maçaneta nem sempre é fácil, por vezes mete medo, queima e deixa ferida, morde e deixa a carne exposta. Mas é esta intimidade que nos dá ímpeto bastante para termos ramos, crinas, asas, ondas, chuva, vento e vulcão, em cada célula do sol que habitamos e da lua onde sonhamos.



Soares Teixeira – 12-07-2013
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