domingo, 1 de junho de 2014

"VOAR" - Soares Teixeira







 


Deitado. O tronco da árvore suporta o meu corpo. Noite. Tudo imaginário nesta cadeira - excessivo até ao real. Falo.
Estrelas, oiçam-nos dizer que somos claridade a enfrentar a claridade e as nossas asas, que nunca desistem de ser feitas de grandes espaços libertos de todos os princípios e todos os fins, silenciosas como rosas a respirar palavras ainda por nascer, secretas como perguntas vivas de rios subterrâneos que têm no gesto a inquietação das suas nascentes, primordiais como cálices anteriores às lendas aos mitos e aos presságios; as nossas asas atravessam o horizonte e saem-lhe pelos olhos – os nossos olhos abertos, desde a raiz da sílaba ancestral até ao verde da floresta para lá dos oceanos. O ímpeto das abelhas entende a viagem desta certeza, o êxtase das falésias entende a imensidade desta ânsia em acender o infinito, as veias dos relâmpagos entendem esta consagração aos braços do além. Entendam vocês também, estrelas. Como borboletas de papel no quintal de uma grande casa os dias passam e passam também as noites, as noites… que é quando vocês, estrelas, saem de dentro de frasquinhos, felizes por poderem mostrar as vossas bocas – às vezes uma ou outra chama-nos aos gritos, com toda a sua luz despenteada e nós vamos para o quintal da grande casa e acenamos e dizemos Olá! Estamos aqui! E dizemos que somos claridade a enfrentar a claridade. Vocês sorriem ainda mais e é então que nós abrimos as nossas asas e vamos dizer-vos: liberdade.
De pé. O meu corpo suporta uma árvore. Voar.
Repito: liberdade.



Soares Teixeira – 31-05-2014
(© todos os direitos reservados)

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