quarta-feira, 23 de outubro de 2013

"OS POETAS" - Soares Teixeira







Os poetas estão no arbusto da palavra
a primavera sabe-o
os poetas estão no cheiro do feno
a terra sabe-o
os poetas estão no noturno cântico das montanhas
a lua sabe-o
Bago a bago
pássaro a pássaro
duna a duna
os poetas vão pelos caminhos dos seus olhos
alimentam-se das palavras que encontram nos frutos
guiam-se pelas asas que os procuram
perdem-se pelos desertos a que entregam os passos
vão      os poetas
mapas sem dimensão
instrumentos sem peso
espaços sem medida
luz salgada dos oceanos espelhados
vão      os poetas
excesso de tudo o que sobra
de tudo o que falta
de tudo o que já não existe
grito do futuro contra o muro do agora
vão      os poetas
confidentes dos bosques e dos insetos
crianças enfeitadas com a música das manhãs
adivinhos de romãs ao pescoço e navios nos pulsos
pintores de astros nas vértebras dos dias
vão      os poetas
vivos vulcões com terramotos nas veias
súbitas acácias a festejar a luz
relâmpagos a morder o pescoço da noite
coelhos a saltar nas nuvens
vão      os poetas
sorriso madrugada eco carícia madressilva
colina pergunta pedra chuva casa medo
trigo sexo gume poeira praia pão
fechadura chave palavra poema liberdade
vão      os poetas

Os poetas são a sua condição
que é ir
simplesmente ir
por dentro de si mesmos
a cada instante morrendo e renascendo
da sombra que a sílaba faz luz
das cúpulas do vento das nascentes do ar
da espantosa claridade da viagem
ir
simplesmente ir
viajar no mistério que espreita por detrás da palavra
ir
simplesmente ir
ao encontro de algo ou de alguém
a que possam simplesmente
dar a mão



Soares Teixeira – 23-10-2013
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