domingo, 10 de agosto de 2014

"A RESPOSTA" - Soares Teixeira








Um dia oferecer-me-ás a resposta
lua cheia grávida de mistério
um dia quando entre duas colinas de vento
o meu corpo deixar de ser irmão da sede
nesse dia quando eu - leve mais leve
que a mesa transparente onde os deuses bebem vinho
habitar o caule do infinito
nesse dia darás à luz a resposta
àquela pergunta que intacta
ambos guardamos na água do nosso compromisso
por enquanto é de âmbar e ametista
a minha sombra de tigre a caminhar na selva
às vezes troco o alimento pelo voo que me é oferecido
(ah frágeis asas que me nascem nos ombros e nos pulsos)
sim troco      e vou - a voar a voar
como se uma cúpula sem matéria me chamasse
vou sim
até que chegue o dia
aquele dia
em que caminhando sobre a incandescência das pétalas esquecidas
atravessarei o meu nome
e tu espera em mim serás então resposta em mim
um dia
não tenho pressa
apesar das sombras o mundo canta instantes belos



Soares Teixeira – 10-08-2014
(© todos os direitos reservados)

sábado, 9 de agosto de 2014

"NAVEGANTE DOS CÉUS" - Soares Teixeira








Aqui me tens palavra
desembarco na tua praia
e olho para a tua floresta
com agudo olhar
caminho como um barco transparente
semelhante àquele que aqui me trouxe
feito de horizonte e unanimidade
aqui me tens
navegante dos céus
que estão dentro das asas
do grande pássaro do tempo
um sonoro silêncio verde chama por mim
a frescura da água despede-se dos meus pés
e eu vou a voar
para o arbusto que me espera

 
Soares Teixeira – 09-08-2014
(© todos os direitos reservados)

"NAVIO DE MÃOS" - Soares Teixeira









Na ardósia do olhar
deixar que o sol escreva azul
e viver a palavra
e nela ser
a gaivota que escreve o poema
lido pelo desejo de ombros nus
depois ir
como rio que se desprende do leito
e consigo leva secretos peixes
nascidos antes das estrelas
ir
como navio de mãos
que afasta os lírios das distâncias
ir
como quem respira os instantes
com a certeza que chegar
é estar prestes a partir



Soares Teixeira – 09-08-2014
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

"LIVRO DE HORAS", Miguel Torga - Soares Teixeira





                                        

terça-feira, 5 de agosto de 2014

"VÉSPERA" - Soares Teixeira







A noite conversa com o Tejo
e todas as palavras são escritas na superfície das águas
ergo a cabeça e bebo astros
(bandos de pássaros com olhares de infinito)
deixo-me ir
sou uma cidade de onde todos já partiram
resto eu
com um saco de serenidade ao ombro
vou
caminho em frente
percorro solitário e frontal a última rua
o próximo passo é numa praia lunar
onde o meu corpo será véspera
de eternidade



Soares Teixeira – 05-08-2014
(© todos os direitos reservados)

"SAÚDO-TE LIBERDADE" - Soares Teixeira








Liberdade, saúdo-te como se crescesse num cravo branco, um grande cravo no alto de um promontório onde se ouvem as sereias cantar – e que canto… tão próximo da claridade, e da dor. Liberdade; minha palmeira reflectida em tantos espelhos; meu animal esbelto que bebe água no lago da luz sempre matinal; meu trigo a cantar chão e céu. Liberdade, saúdo-te! Daqui, deste promontório onde sou barca que cresce num cravo branco e aspira voar até à serena navegação entre os astros. Saúdo-te imaculado clarão inicial, saúdo-te nascente da água que é começo da primeira festa. Saúdo-te, liberdade para regressar ao magma que fui; à rocha onde me descobri; ao mar onde me deslumbrei; ao pântano onde lutei; ao prado onde pastei; à árvore em que me transformei; ao céu para onde voei; às asas onde me demorei. Saúdo-te, canto e dança do silêncio; saúdo-te, pão e vinho da minha viagem. Saúdo-te! Aberto como aroma de romã a beber além. Já sem pés onde possa bater o coração da terra; já sem coxas onde se possam enrolar as ervas dos instantes; já sem ombros onde possam poisar os olhos das nuvens, saúdo-te liberdade! Já só barca a ascender à brisa; já só breve toque no belo cravo branco, saúdo-te liberdade! Saúdo-te liberdade e vou. Vou, até ser procurado por um nome – e de novo recomeçarei.


Soares Teixeira – 04-08-2014
(© todos os direitos reservados)

domingo, 3 de agosto de 2014

"SER AGOSTO A BEIJAR O MAR" - Soares Teixeira








Agosto beija o mar
a nossa praia é a areia fina da alegria
estamos descalços
os pássaros não precisam de sandálias
para voar
e nós saboreamos a festa azul do beijo
voamos sim
entornados na liberdade dos ventos
e na respiração das nuvens
asas abertas de sol feliz
como se sentíssemos
que estivemos tempo demais
poisados num ramo de árvore
ali sem ser lábios a brilhar em lábios
quanto tempo?
dois minutos? Um minuto?
demasiado! Uma eternidade!
Voar! Voar! Sim! Voar em beijos!
ser Agosto a beijar o mar


Soares Teixeira – 03-08-2014
(© todos os direitos reservados)