quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

"LEMBRAS-TE?" - Soares Teixeira




Fotografia de Mendes Domingos





Lembras-te?
lembras-te quando habitávamos a mesma pálpebra?
lembras-te quando nos abrigávamos sob o mesmo além?
lembras-te daquela porta feita de certeza?
lembras-te daquelas janelas feitas de riso?
lembras-te?
quando nos iniciávamos na flor de todas as forças?
quando nos celebrávamos no sal de todas as esperanças?
Lembras-te da nossa casa?
aquela casa que construímos com sonhos e bandeiras
e cânticos nos pulsos e espaços nos lábios
e tesouros que sentíamos nas veias e gostávamos de partilhar?
lembras-te?
quando as cúpulas deixaram de ser negras?
quando as flores deixaram de ter as gargantas caladas?
oh céus dos nossos passos!
oh céus do nosso peito!
oh céus das nossas vozes!
devolvam-nos a luz com que cobríamos a matéria!
devolvam-nos a brisa onde renascidos ondulávamos!
devolvam-nos a centelha do desejo que nos fez felizes!
Como fomos férteis dentro daquela casa
como fomos abundantes no interminável chão daquela casa
como fomos tão nós mesmos
a respirar como cravos em promontórios
a respirar como mesas de pedras solares
a caminhar como montanhas
lembras-te?
era assim na nossa casa
era assim quando subíamos para a parte mais alta do nosso olhar
era assim quando nos sentíamos o perfume da liberdade
lembras-te?
lembras-te?
tens de te lembrar!
é preciso!
as cúpulas estão a escurecer com as cinzas dos nossos dias
as cúpulas estão a escurecer
as cúpulas estão a escurecer e as flores têm nós na garganta
tens de te lembrar!



Soares Teixeira – 05-02-2014
(© todos os direitos reservados)