sábado, 18 de junho de 2016

"DESPERTAR" - Soares Teixeira



Ai o prazer de acordar num poema
e estender os pés sem dar pelo fim do lençol da palavra
e estender os braços e as mãos e sentir os astros
e estender o olhar como quem regressa à luz
depois calçar os chinelos do espanto
caminhar no quarto encantado até junto da grande janela
feita de cisnes, nuvens e pulsação de ânforas mágicas
abri-la, com um sorriso, aos ventos de todas as cores
e ficar a sós com a areia da praia
e construir castelos à beira mar
e convidar as sereias para neles morar



Soares Teixeira –18-06-2016
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 16 de junho de 2016

"O SOALHO QUE RANGE - Soares Teixeira



Abro a porta devagar
Lá estás tu
Ricardo Reis
Atrevo-me… e entro
avanço uns passos
devagar porque o soalho range
e não te quero incomodar
Estás sentado a uma secretária
não me vês
mas eu vejo-te
sereno, tranquilo,
disciplinado no gesto lento com que folheias
o jornal que estás a ler

Observo em redor
Dois jogadores de xadrez
deslizam no espaço
entre eles o tabuleiro com as pedras
e um púcaro de vinho
a um canto ardem casas e mulheres são violadas.
Indiferentes,
apenas atentos ao seu velho tabuleiro de xadrez
os jogadores jogam

Cerro os punhos
As minhas horas não são plácidas
Não sei que faço aqui
nem como aqui vim parar
Mas o facto é que aqui estou
e estando sou
sem nada nas mãos
a não ser o elas estarem fechadas

Penso:
(enquanto oiço os sons da cidade destruída
- aquela, ao canto, e a que me arde no peito)

Execrável, aquela besta humana
que já nem memória tem
da sua própria humanidade
Tornou-se demora de ódio
sobre os pinheiros que crescem
nas almas alheias
Lá, no fundo da gruta onde se refresca
com o sangue das suas vítimas,
abraça os mortíferos insectos
que diligentemente vai criando
e quando leva as mãos aos lábios
acaricia
o gume da lâmina com que mente
e mente e mente e mente

Os jogadores de xadrez observam-me
por breves instantes, com ar interrogativo
Enfrento-os

O ângulo do meu queixo questiona-os

Calma?
louvar a serenidade?
ser sossego na vida?
não resistir à atrocidade de homens e deuses?

Regresso ao meu íntimo

Ah! Se as minhas sílabas não tivessem despojos
dos meus dias…
mas têm! E é esse húmus que faz
com que me nasçam as garras
que cravo no fogo e no gelo!

Ganho coragem e avanço
Estendo o braço para tocar no ombro de Ricardo Reis
E ouso falar
- Dizes, Ricardo Reis
“não consentem os deuses mais que a vida”
Digo, eu, alguém e ninguém,
- Não consinto aos deuses menos que a vida!

Tremo
A minha mão está sobre o espaldar da cadeira
Atravessei Ricardo Reis! Atravessei-o!
Recuo atemorizado
Ricardo Reis volta-se e observa-me, circunspecto,
Não tenho forças para mais e grito:
- Eu sou o soalho que range!
E saio dali a correr



Soares Teixeira –13-06-2016
(© todos os direitos reservados)


(Nota: Ricardo Reis é um dos heterónimos de Fernando Pessoa).

quarta-feira, 15 de junho de 2016

"A QUEDA" - Soares Teixeira



Sou
do pecado original
o agradecido resultado
a cair para os astros
e digo à Lua
- olha para mim, meu amor
abençoa a queda de um pecador

A minha culpa
é não olhar para trás
quando remo nas minhas feridas
e ir
sem deixar a vida
dentro de um violino abandonado

Estou no mundo
e fiz contrato com o horizonte
eu dou-lhe a nudez do meu espanto
ele paga-me com maçãs
que mordo e como
sofregamente
em cada pergunta que faço
em cada onda que me escuta
em cada pássaro que me leva

Que me importa cair
se a minha queda é solene?
Sim, caio nos astros
caio de agradecimento
e a minha túnica é feita de descoberta
e nas pálpebras levo o som do mar



Soares Teixeira –14-06-2016
(© todos os direitos reservados)

terça-feira, 14 de junho de 2016

"EQUAÇÃO" - Soares Teixeira



Cada um de nós
uma carta escrita
e por escrever
uma janela aberta
e por abrir
um barco em viagem
e por zarpar

em cada um de nós,
o gesto dentro de um gesto
que já foi
a folhagem de uma árvore
que há-de ser
o centro de um sonho
a acontecer

e na retina
a intimidade
de uma equação

por resolver


Soares Teixeira –11-06-2016
(© todos os direitos reservados)

domingo, 12 de junho de 2016

"DELFOS" - Soares Teixeira



Quando a palavra é luz
o instante é Delfos
e o corpo é asa

Quando o Sol nasce
dos lábios do Saber
acende-se a hora de renascer

Quando a viagem
chega aos dedos do sentir
o tumulto é universo nas veias

e todas as coisas são além
e tudo é acorde e desordem
e prazer de ir, ficando aquém



Soares Teixeira –11-06-2016
(© todos os direitos reservados)

sábado, 11 de junho de 2016

SOBRE O LIVRO “ANUNCIAÇÕES”, DE MARIA TERESA HORTA



Imagino Hildegarda de Bingen e Sandro Botticelli. Imagino-os voltarem-se, surpreendidos com uma luz súbita. Maria e Gabriel estão ali, de mão dada, sorridentes, fulgurante pureza no promontório do prodígio. Começa então a Palavra e a Palavra é o Livro. Uma voz abre-se nos espaços e abre os espaços ao tempo. Poema a poema a voz reúne, acolhe e revela, mistério, rumor de além, respiração marítima, unidade solar, sal da linguagem, medula da sílaba. A voz é o que foi, o que vai sendo e o que será. A voz vem de uns lábios que são fissura de luz no horizonte. A sábia monja beneditina julga estar perante outra das suas visões, o Mestre Florentino quase treme – parece-lhe reconhecer as feições de Maria e do Anjo. Ambos avançam. Surpreendidos e fascinados observam o desenrolar de uma grande história, uma história ímpar, serena e telúrica. Aquela voz, única, una, mas também tríplice, aberta em flor de mistérios, provém dos lábios da Mãe de Cristo, do enviado do Senhor e de… de quem?, perguntam Hildegarda de Bingen e Bortticelli - de Maria Teresa Horta, respondemos nós, que também lá estamos, rodeando o lugar onde tudo se desenrola. E o lugar é o ser viagem.


Soares Teixeira – 07-06-2016
(© todos os direitos reservados)

domingo, 5 de junho de 2016

MARK ZUCKERBEG CONVERSA COM ASTRONAUTAS DA ESTAÇÃO ESPACIAL INTERNACIONAL





Histórica conversa, dia 1 de Junho de 2016, que ocorreu em directo no Facebook, 
entre Mark Zuckerberg e três astronautas da Estação Espacial Internacional,