Imagino Hildegarda de Bingen e Sandro
Botticelli. Imagino-os voltarem-se, surpreendidos com uma luz súbita. Maria e
Gabriel estão ali, de mão dada, sorridentes, fulgurante pureza no promontório do
prodígio. Começa então a Palavra e a Palavra é o Livro. Uma voz abre-se nos
espaços e abre os espaços ao tempo. Poema a poema a voz reúne, acolhe e revela,
mistério, rumor de além, respiração marítima, unidade solar, sal da linguagem,
medula da sílaba. A voz é o que foi, o que vai sendo e o que será. A voz vem de
uns lábios que são fissura de luz no horizonte. A sábia monja beneditina julga
estar perante outra das suas visões, o Mestre Florentino quase treme –
parece-lhe reconhecer as feições de Maria e do Anjo. Ambos avançam. Surpreendidos
e fascinados observam o desenrolar de uma grande história, uma história ímpar,
serena e telúrica. Aquela voz, única, una, mas também tríplice, aberta em flor
de mistérios, provém dos lábios da Mãe de Cristo, do enviado do Senhor e de… de
quem?, perguntam Hildegarda de Bingen e Bortticelli - de Maria Teresa Horta, respondemos
nós, que também lá estamos, rodeando o lugar onde tudo se desenrola. E o lugar
é o ser viagem.
Soares Teixeira – 07-06-2016
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