Hoje preciso de uma palavra sincera
que me fale de pássaros
de lugares pitorescos
e do começo do amor
uma palavra honesta
mas qual?
qual? Não me ocorre nenhuma
e necessito urgentemente dessa palavra
ela que venha
que venha rápido
e repeti-la-ei por dez vezes
vem palavra amiga vem
vem!
sem qualquer insinuação entre as sílabas
sem murmúrios escondidos por detrás das letras
sem nenhuma sugestão à sua volta
estou cansado das sombras das palavras
e dos seus reflexos e da suas obesidades
e dos anéis que levam nos dedos
há dias assim
sinto as costas curvadas
sob o peso de palavras de granito húmido
com espigões nas arestas
e estranhos desenhos gravados nas suas faces
demoro-me num nada
rodo a cabeça procurando relaxar
tento ter a idade do silêncio
e fico pensar na eternidade
mas isso é ser muito velho ou não ter idade
e eu quero ter idade e não quero ser muito velho
não me apetece
hoje já envelheci o suficiente ao som de falsas claridades
seria bom ser flor ou rio
para não pensar nestas coisas tão parvas
mas tão parvamente reais
ah se eu me transformasse agora em cavalo
daria já meia dúzia de pinotes e voava para outro lugar
mas os cavalos não voam
não?
e porque não?
olha…
achei-a
achei a palavra
sou branco e relincho de gozo
conseguem ver as minhas asas?
voar voar voar voar voar voar voar voar voar voar
Soares Teixeira – 23-03-2015
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