sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

"ASSIM ÉRAMOS" - Soares Teixeira





Era manhã em nós

E o mar    
macio
ondulante ebriedade
a cobrir desassossegos e segredos

E os barcos    
a sulcarem as águas
em sôfrega ânsia
de se fundirem com o horizonte

E o outro mar ali ao pé
de olhos postos em nós
com os outros barcos ancorados
a descansar de si mesmos

E assim éramos
corpos líquidos
braços em viagem
riso de distâncias penetradas

pássaros de quimera



Soares Teixeira – 20-02-2015
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

"COMO ASTROLÁBIOS" - Soares Teixeira





Olhámo-nos como astrolábios
e fomos em beijo o mel da chama
e hoje, ainda claridade sem fronteiras
continuamos um no outro vento vivo

a tua sede de abelhas em fogo
puxa pelas mãos com que atravesso
a distância que não nos separa
a minha garganta a ondular na luz inaugural
habita o grito de em ti ser galope
de cavalo vermelho sobre o mar

como astrolábios olhamo-nos
ainda tão na proa de nós mesmos
e recordar aqueles que um dia fomos
é beber do vinho da nudez onde nos baptizámos



Soares Teixeira – 19-02-2015
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

"POR ENQUANTO" - Soares Teixeira





Noite

Quase me oiço
num além tempo
a cantar o instante
das novas águas
grávidas de navios de luz

Quase me vejo
num aroma de lugar
a viver a rosa
que recebe esta asa
que em segredo vou sendo

Quase me igualo
à incandescência
que habita
numa gota de olvido
que sabe que a praia virá

por enquanto
céu
mar
nesta ânfora de possível
que guarda o impossível

onde estou



Soares Teixeira – 18-02-2015
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

"AINDA" - Soares Teixeira





Manhã
o sol a libertar-se de cada coisa
o chão próximo dos deuses
no céu uma nuvem
lenta
para onde foram os pássaros
que se desprenderam das asas
voando apenas
em transparente existência
com forma de palavra
num vislumbre de poema
isso foi
já na polpa do descanso
lado a lado
mãos dadas
num sossego
de dedos em quase sono
isso foi
depois de nos termos consagrado
às laranjas e aos figos
que habitam os astros
libertando braços e pernas
como peixes atirados a um rio
ávido de mar
isso foi
depois  do vulcão
quando um no outro
esse mar chegou
isso foi
na praia
onde ainda caminhamos
leves aves
ainda a começar o mundo



Soares Teixeira – 12-02-2015
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

"AMO-TE" - Soares Teixeira





Cada segundo nosso
é tempo recém-nascido
dum navio onde somos proa
ao longe
grandes sílabas solitárias
mexem as suas mandíbulas de ouro
num lento soltar de sons
que se misturam
com aqueles que saem
dos ombros das ondas
ao roçar na claridade dos espaços
cla     ri     da     de  
dos
es     pa     ços
a imensidade descansa
sobre a nossa junção de argilas
num único corpo
todas as torres do mundo
por nossa causa caminham
na mesma direcção
num pesado balanço
que as faz parecer quase ébrias
lá vão elas, contentes
dirigem-se para o sagrado lugar
onde três grandes sílabas se juntaram
para com as suas mandíbulas de ouro
fazerem ecoar até aos nossos lábios
esta unidade na carne em flor

amo-te



Soares Teixeira – 11-02-2015
(© todos os direitos reservados)