sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

"BELA ADORMECIDA" - Soares Teixeira





Da noite dos dedos adormecidos
voam difusos bailes de grandes asas
a orquestra liberta vertigem
desligados do chão dançam pares
que rodam como fontes sem peso
a luz faz-se êxtase nos cristais
e o riso dos reposteiros confunde-se
com o dos vastos salões

Adormecida
com uma rosa sobre o peito
a sua respiração extinguiu o tempo
e deixa que em si se cumpra o infinito

Bela
tornou-se céu da espera

No intenso silêncio da flor
a certeza que a mantém fresca
é que há um beijo a beber distância



Soares Teixeira – 16-01-2015
(© todos os direitos reservados)


quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

"DISSE-TE" - Soares Teixeira






Disse-te
“Um dia escreverei um poema de amor
com as cores com que agora sou janela
aberta à luz que amadurece na manhã”
Disseste-me
“possui o silêncio do aroma
e que tudo o resto
sejam jardins por nascer”
Não sei
para quando a água desse tal poema
“Vou sendo espuma”
é tudo quando posso escrever
e escrevo
em cada teu momento de corpo

 
Soares Teixeira – 15-01-2015
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

"SEARA" - Soares Teixeira





Às vezes sinto
gaivotas vermelhas
em viagem pelo sangue
isso acontece
quando me ergo
em seara
até ao sol de ser
promontório
no horizonte de um navio
a que o mar chama
liberdade


Soares Teixeira – 14-01-2015
(© todos os direitos reservados)

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

"A SEDE DO POETA" - Soares Teixeira





Quando a sede assola o poeta
a palavra chove-lhe dentro do peito
sente-se o cheiro a terra molhada
e o poema cresce
ao lado das árvores
das folhas caídas e dos insectos

Lá no alto as gaivotas levam-lhe
a camisa as calças e as sandálias
e o poeta vai nu
com os rochedos e o mar e o céu
por única companhia
às vezes um gato sai
do seu corpo
e salta para um astro na mão da noite

quando isso acontece
húmida
a terra
ao assistir ao secreto desdobramento
do poeta
oferece-lhe os seus seios e as suas coxas
e o seu sexo
e diz-lhe
“Cresças em sede
assim na terra como nos céus”



Soares Teixeira – 13-01-2015
(© todos os direitos reservados)

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

"CISNES" - Soares Teixeira



(Foto: In "Le monde en noir...", s/ identificação de autor)


       Somos
dois dedos abraçados
sem sabermos
qual o meu
qual o teu
dois dedos
como dois pescoços de cisnes
enlaçados
e o grande prodígio do instante
é que tudo à nossa volta é mar
e nos convida a ir
rumo à primeira respiração
dos humanos vulcões
e em seguida
a bebermos
da inesgotável fonte
onde os anjos são de luz lunar
e onde
depois de redescoberta
a geografia do corpo
o silêncio de seremos
inteiramente cisnes
nos canta aquela nossa canção
            nós
poemas de asas brancas
em paisagens a começar
cantamos também
com a voz do olhar



Soares Teixeira – 12-01-2015
(© todos os direitos reservados)