domingo, 21 de julho de 2013

"A PEQUENEZ" - Soares Teixeira







A pequenez senta-se na sua imensa poltrona de vaidade
respira fundo o sol da sua aparência
e alimenta-se do seu próprio discurso
são assim os ditadores do quotidiano
são assim os que vivem em permanente entrada triunfal no seu ego
são assim os que vivem o permanente êxtase da ascensão da sua auto-estima
os que acham que os seus pensamentos são a matéria-prima dos instantes
os que acham que os seus gestos são gorjeta para a condição alheia
os que acham que todos os seus caprichos são absolutamente naturais e reservados aos escolhidos
na grande selva humana são hienas
mas no seu íntimo sabem que jamais terão a nobreza do tigre
por isso no fundo do seu estreito corredor cerebral contorcem-se num choro abafado sozinhos e em silêncio
por isso a sua tirania
por isso a sua pequenez
por isso o seu cinismo e cobardia



Soares Teixeira– 21-07-2013

(©todos os direitos reservados)

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Laurence Olivier - Hamlet





É-me difícil pensar em Hamlet e não me vir à memória o lendário "Hamlet" de Laurence Olivier. Neste filme de 1948, com direcção, produção e interpretação de Sir Laurence Olivier a Arte atinge níveis estratosféricos.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

"ÀS VEZES O INSTINTO INUNDA O INSTANTE" - Soares Teixeira

Às vezes o instinto inunda o instante com a sua própria claridade. A lógica e a razão abandonam a partitura do ser e a melodia passa a ser tocada com estranhas notas, súbitas e nunca imaginadas. Pode acontecer ficarmos frágeis, balbuciando incógnitas e com os passos do sentir um pouco trôpegos. Estamos habituados a alguma segurança íntima e a alguma firmeza nos lábios – nos de carne e nos do pensamento. Às vezes, porém, acontece olharmos; irmos; estendermos os braços; chamarmos, com a mesma certeza com que bebemos um copo de água, mas… depois essa mesma água torna-nos pântano e afundam-nos em nós próprios, na nossa dúvida. Será? Não será? Acreditar? Não acreditar? Que cada um tome o caminho que lhe for mais fácil; há os incondicionais do acreditar e outros nem por isso. Há certo tipo de incidentes com está máquina falível, que somos, que ficam na memória. Há quem depois venha dizer: “tive uma experiência”, os que dirão:”aconteceu-me uma coisa gira” e ainda os adeptos do: ”com essas coisas não se brinca”. Que tem razão? talvez Hamlet, que nos diz lá do seu nórdico castelo: “Ser ou não ser, eis a questão”.




Soares Teixeira – 15-07-2013
(© todos os direitos reservados)

sábado, 13 de julho de 2013

"COMEÇO DE OLIVEIRA" - Soares Teixeira





(Foto de Stephenjmed)


As longas fitas coloridas
de onde nos desenrolamos
no decurso dos dias
e que nos permitem
respirar as extensões
do olhar e do pensamento
estendem-se e estendem-nos
até ao fim do promontório
que nos foi oferecido

a partir dai
essas longas fitas
cumprida a sua missão
envolvem-nos a face
depois todo o corpo
e recuam
levando-nos até ao íntimo
da distância sempre questionada

no chão do grande poema
numa secreta sílaba do tempo
receberemos a água inicial
e baptizados pelo mistério
de novo nos converteremos
em começo de Oliveira




Soares Teixeira – 13-07-2013

(© todos os direitos reservados)

"ENQUANTO O ESPAÇO NÃO NOS RECUPERA" - Soares Teixeira

Enquanto o espaço não nos recupera, recuperemos - a cada amanhecer - o perfume do trigo que somos. Chegará o dia em que sacudiremos os nossos ramos e não os veremos, Olharemos depois o nosso corpo, espantados, e perguntaremos pelas crinas, pelas asas, pelas ondas, pela chuva, pelo vento, pelo vulcão; por tudo aquilo que era a nossa matéria. E agora? Perguntaremos ao nos vermos despojados da metamorfose do quotidiano e do sentir. E agora? Que sou eu sem corpo? Sem aquele corpo que me fazia ser múltiplo, não apenas em pensamento. E agora? Os ossos; a carne; a pele; o gesto e o gosto da vontade concretizada, onde estão? Enquanto o espaço não nos reclama, reclama-nos a intimidade de tudo o nos observa, como se fossemos uma porta por onde é suposto entrar. Cumpre-nos saber abrir essa porta e saber fechá-la – consoante as circunstâncias. É certo que a maçaneta nem sempre é fácil, por vezes mete medo, queima e deixa ferida, morde e deixa a carne exposta. Mas é esta intimidade que nos dá ímpeto bastante para termos ramos, crinas, asas, ondas, chuva, vento e vulcão, em cada célula do sol que habitamos e da lua onde sonhamos.



Soares Teixeira – 12-07-2013
(© todos os direitos reservados)


"O AMANHÃ ESTÁ DISPERSO NA ETERNIDADE" - Soares Teixeira

O amanhã está disperso na eternidade. A barca já navega, rumo ao seu destino – ao teu destino, Luís. Agora o único som é o do diapasão do mistério. Escuto Mozart, enquanto tento reunir algum entendimento disperso. Aqui as coisas continuam como as deixaste; entre palavras, cordeiros e hienas o mundo continuará a girar. Debruço-me sobre mim mesmo para observar alguns promontórios, alguns arquipélagos, algumas aves marinhas. As ausências podem ser uma espécie de presença forte. Acredito que sim. É bom irmos acreditando nalguma coisa que nos ajude a não estar tão ausentes de nós próprios. A música ajuda. Escuto Mozart. A música é aquela pátria onde todos nos reencontramos. Não é necessário estarmos fisicamente perto uns dos outros para, através da música, apertarmos a mão, sorrirmos, partilharmos o olhar e aceitarmos a intromissão dos pássaros. Não me passa pela cabeça fazer outra coisa senão escrever estas linhas e escutar música. Evidentemente que compreendes. É um concerto de piano, a minha companhia - obviamente piano. Escolhi Mozart por uma razão psicológica e sensorial; preciso de claridade. Há uma certa linha comprida e clara que às vezes se torna necessária, como um fio que nos ajude a chegar a qualquer lado, a sair de um qualquer labirinto ou simplesmente que nos una a algo que está longe mas com uma proximidade latente. Evidentemente que entendes. Dá-me um abraço. Um beijinho à Hermínia, um abraço ao Ricardo. Até um dia.



(singela homenagem a Luís Manuel Sande Freire, que se ausentou deste mundo a 12 de Julho de 2013, aos 80 anos - um grande Amigo)

Soares Teixeira – 12-07-2013
(© todos os direitos reservados)


quinta-feira, 11 de julho de 2013

"LENTO O SOM PROPAGA-SE" - Soares Teixeira

Lento o som propaga-se, quase resto de eco, quase silêncio. Ouve-se ainda, mas muito pouco. Dói. Na planície derradeira, árvores translúcidas ladeiam uma flor de caule quebrado. Aguardam que o tempo vivido seja tempo convertido em novo lírio. Tudo está recolhido dentro de si mesmo, numa ordem própria do destino. O som, talvez de sino, quase desligado da realidade é, contudo, um sulco de arado no sentir. Prepara-se a hora nova, preparam-se as novas águas, prepara-se o reencontro. Uma flauta e um pano de linho estão suspensos, junto da flor no limiar do eterno. Aguardam o momento em que hão-de receber a nudez do espírito. Lento, o som quase não existe, apenas a sua distância nos é frontal. Lento, o som quase se converte num rumor de ondas de um mar desconhecido, a bater no casco de uma barca que aguarda pela viagem. Toda a inteireza do enigma observa o tudo rente ao nada, o nada rente ao tudo. No caule quebrado da flor está um embrião de unidade. Tudo tão frágil. Ainda habitas a matéria, Luís – e amanhã?



Soares Teixeira – 11-07-2013
(© todos os direitos reservados)