quinta-feira, 30 de maio de 2013

"SOLENIDADE" - Soares Teixeira





Cabo Sounion, Grécia




Encosto o sol à boca
e tudo é sagrado
estou carregado de pensamentos
como uma grande laranjeira
no pomar que guardo
atrás das pupilas
Através de mim
o instante está feliz
e o seu caule
eleva-me no espaço
Solenidade
A distância chama pela palavra
e pede-a em casamento
ela
vestindo-se rápido
com o meu sorriso
diz que sim
Um pássaro prepara a festa
entrançando luz
nos ramos das árvores
Não sei o que me apetece
nem o que desejo
sei que pertenço às falésias
de onde aceno
a veleiros de claridade



Soares Teixeira – 30-05-2013
(© todos os direitos reservados)

domingo, 26 de maio de 2013

"PÉS" - Soares Teixeira



Alonguei os pés
como quem calça uns sapatos novos
e mergulhei-os dentro da água
nua e fresca
a oferecer-se
como presente sempre eterno
As minhas mãos estavam
ao lado do corpo
sobre a rocha onde me sentava
mas tinha os braços abertos
porque era assim o meu respirar
O mar recebia
os peninsulares dedos dos meus pés
que se abriam e contorciam de gozo
como príncipes
celebrando a conquista de um novo reino
O sol a debicar-me nas pálpebras
cada raio uma gaivota
em busca de alimento
talvez os meus pensamentos
Com todos os navios do olhar
rumo ao horizonte
levava nessa tranquila frota
os meus sentimentos
o resto
matéria para dar vida à liberdade
que ficasse
como a rocha
o olhar que fosse
ser instante sem moldura
Ao ver uma gaivota passar
senti-a tão verdadeira como as outras
as que são feitas de luz e espanto
e que eu alimento
com aquilo que me dá o ser
o pensamento
De repente dois peixes
a passear tranquilos no mar
chamam-me a atenção
sinto-os felizes
debruço-me para os ver melhor
faço-os agitar
saltam como loucos
como são bonitos
os meus pés

Soares Teixeira – 15-05-2013

(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 16 de maio de 2013

"NÓS PRÓPRIOS" - Soares Teixeira








Um dia separámo-nos das rochas
e caminhámos em frente
pela planície da dor e descoberta
connosco levámos
a incandescência do magma
e dela fizemos nascer
ao som de flautas e canto
o jardim de palavras
com que hoje
perfumamos os dias
Se estamos aqui
é porque o tempo nos aproximou dos seus lábios
para nos beijar e dizer o nosso nome
sílaba a sílaba silêncio a silêncio
O horizonte observa
o trabalho de sermos nós próprios
dentro e fora do reino do nosso corpo
Sejamos pois frontais às lutas
nem que para isso tenhamos de ser
a derradeira asa de um poema



Soares Teixeira – 16-05-2013
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 15 de maio de 2013

"GATO" - Soares Teixeira









Quase noite

O gato aproximou-se
sentou-se sobre as patas de trás
lambeu uma pata da frente
colocou a cauda em volta do corpo
e olhou-me fixamente
Senti-me intimidado
trespassado
e decidido enfrentei-o
olhos nos olhos
De súbito
silenciosamente o gato pulou
para cima da Lua
e todo o universo entrou nas suas pupilas
eu também
Confuso espanto de viagens improváveis
antiquíssimas luzes de brilhos sem orla
longos vazios de onde o tempo emerge e submerge
inviolado mistério de estranhas combinações
Colocam-me a mão no braço
volto-me com músculos e olhar de felino
fui rápido e conciso no meu silêncio
e regresso ao outro gato
desaparecera
O instinto mandou-me olhar para a Lua
sorri
e deixo-me escorregar
para dentro de mim mesmo
De novo humano
bebi outro golo de café

noite


Soares Teixeira – 02-05-2013
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 8 de maio de 2013

"THE HOUNDS OF GREEVOR" - David Kemp







Extraordinária obra do artista David Kemp feita com velhas botas de mineiros de uma mina desactivada. A força que trabalhava nas entranhas da terra magnificamente homenageada.



domingo, 5 de maio de 2013

"LIBERDADE" - Soares Teixeira










Ah…
respirar o cheiro a lavado da palavra
com ela escrever o mundo na alma
com ela escrever a alma no mundo
Ah…
mergulhar as mãos na palavra
com ela baptizar o pensamento
e nele navegar
com ela renovar o horizonte
e dele renascer
Ah…
tactear o caminho da palavra
ser dedos que se confundem com os lábios
ser lábios que se confundem com os dedos
e beijar a criança que existe dentro da palavra
Ah…
entrar com a transparência do corpo dentro da palavra
e nele soltar pássaros em voo desabrido
e com eles ser romance exposto à luz
e dela receber a desordem soprada pelo tempo
Ah…
a palavra que respira em cada colina do instante
a palavra que mostra o gesto a nascer do lugar
a palavra que habita o orvalho do silêncio
a palavra que gosta de sentir o sol no pátio da vontade
Ah…
tantas palavras
a florir à volta da cintura
de todas escolho uma
a palavra mãe de toda a palavra futura
Ah…
liberdade


Soares Teixeira – 01-05-2013 - 23:48
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 1 de maio de 2013