Recordando quando fui Oficial Engenheiro Maquinista da Marinha Mercante
Recordando quando fui Oficial Engenheiro Maquinista da Marinha Mercante
Os chocolates são bons
mas sabem melhor ainda
quando comidos num ócio
a sobrar do tempo
Dentes boémios
mordem a matéria idílica
e a língua, dentro da boca
vai movendo o dorso de nuvem
com lento prazer
Gosto de fazer a vontade aos chocolates
e sorrir para dentro de mim
ainda que um ou outro canto de lábio
denuncie ao mundo o meu deleite
ao comê-los suavemente
como se estivesse a produzir vagar
e essa fosse uma tarefa
a que tivesse de prestar contas
no livro de deve e haver dos meus sentidos
É bom
deixar-me desgovernar por chocolates
e saber disso
e olhar para o outro lado
para o Belo com que o mundo fica vestido
quando estou a comer chocolates
principalmente
se comidos
em longo e manso ócio
Chocolates…
O poder que têm em mandar embora
toda a ciência, toda a filosofia!
Deuses?
Qual quê!… Chocolates! Isso sim!
Heróis?
Que pequenos são, comparados com os chocolates
Poesia?
É boa para embrulhar planetas
Chocolates
Tragam-me chocolates
e com eles viajarei pelo meu reino
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(© todos os direitos reservados)
É à meia noite da terça feira de Carnaval que em Veneza acontece "La Vogata del Silenzio". De Rialto a São Marcos uma procissão de dezenas de gôndolas desliza em silêncio pelo Grande Canal. Ninguém fala para não perturbar o mistério e o encanto. A iluminação é a das pequenas luzes das embarcações, a que decora as varandas e janelas dos palácios, e o luar. Em São Marcos as gôndolas juntam-se em volta de um animal gigantesco que está sobre uma plataforma flutuante (um touro, no ano em que fui neste desfile mágico). Incendeia-se o Carnaval velho, assim o celebrando, e saúda-se o que há-de vir. Em seguida é o fogo de artifício. E pronto, é o fim. Caímos na realidade. Mas um último olhar de já saudade pergunta: Será mesmo o fim? "La Sereníssima" responde-nos dentro da alma.
Parecem tão definitivos
os cavalos
quando correm em liberdade
pelas planícies
Não receiam nenhum chão
não temem nenhum vento
não se negam a nenhum horizonte
Belos
em cada músculo
em cada movimento
em todas as certezas
As paisagens
vão ficando
debaixo das suas patas
O tempo
cheira-lhes as crinas
e tenta abraçar-lhes o pescoço
mas não consegue
porque eles são mais velozes
que pensamentos
que estes meus pensamentos
vindos não sei de que águas
de que recantos ou de que caminhos
Nesta nudez de alma
partilhada não sei com que astro
preciso destes meus cavalos;
de os ver nascer
de os sentir surgir
alados
de um qualquer lugar no universo
para depois poisarem
nas minhas planícies mentais
belos
preciso de vê-los correr
livres
no meu chão de cicatrizes
que eles não receiam, não temem
e a elas não se negam
Corram, corram meus cavalos
para que eu vos inveje a liberdade
para que eu não desista de vos amar e seguir
para que eu não desista de mim
Venham, cavalos meus
de um qualquer sol
ou de um qualquer verso
venham
erguer-me em mar a ondular e a voar
no céu que eu escolher
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(© todos os direitos reservados)