segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

"DENTRO DO PEITO" - Soares Teixeira




Aqui
dentro do peito
guardo-te inteira
Lua
no secreto ninho
do meu ser
envolta por antigas linguagens
antigos signos
antigos mistérios
e tantos absolutos por acontecer
guardo-te
serás a minha voz
quando um dia
me tornar flor esquecida
entre orvalho de silêncio
guardo-te
dentro de mim
para que dentro da tua carne
de linho e asa
para que dentro da tua alma
de mar e sílaba
eu possa ser o suave ondular
de um outro navio
num outro horizonte
aqui
dentro do peito
guardo-te inteira
Lua
intacta respiração
do relâmpago
intacto timbre
de um piano de cauda infinita



Soares Teixeira – 29-02-2016
(© todos os direitos reservados)

domingo, 14 de fevereiro de 2016

"VIAGEM" - Soares Teixeira



Viver
viajar do centro
para a periferia
do efémero
pelo caminho
amar


Soares Teixeira – 14-02-2016
(© todos os direitos reservados)

sábado, 13 de fevereiro de 2016

"A VELHA" - Soares Teixeira




Quando se lhe referiam como “a velha”
olhava-se ao espelho dos instantes
e via-se como uma flor de caule quebrado
era inevitável essa visão – ela sabia-o
mas a viagem pelos muitos invernos
dava-lhe aquele porte de árvore rodeada de planície
e no sorriso dos seus lábios
havia mãos exímias na arte de tocar a harpa dos dias
por isso o olhar do sol e das flores
gostava de habitar as suas pupilas
por isso as feridas de muitos mais jovens em idade
viam nela um secreto bálsamo – todos o sabiam



Soares Teixeira – 13-02-2016
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

"HÁ POEMAS" - Soares Teixeira




Há poemas
que se aproximam
e cumprimentam quem os lê
pode ser um breve piscar de olho
um forte abraço de amigo
de infância ou de solidão
ou um suave aceno de alma
com leveza de instinto

Há poemas
que se juntam aos plátanos do peito
e ficam ali
com as suas águas, a sua terra e o seu chão
a falarem de coisas para lá das palavras
coisas anteriores à luz e às trevas
e às pontes entre os instantes
e a todas as estranhas misturas do tempo

Há poemas
destemidos como dragões alados
outros trémulos, a tactear os instantes
uns lançam as suas sílabas em ímpetos solares
outros agasalham cuidadosamente cada palavra
uns trágicos, outros alegres
uns são a janela por onde espreitamos
outros a porta por onde nos observam

Há poemas
por todo o nosso azul de céu e mar
por todo o verde da nossa folhagem
ainda bem
para que a semente da liberdade
não deixe de germinar
para que as nossas asas cumpram o seu destino
voar



Soares Teixeira – 11-02-2016
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

"A MULHER LIBERTA" - Soares Teixeira






Onde estava o arado do canto?
onde estava o trigo da dança?
já nem sequer um sonho a cingir a cintura
já nem sequer uma concha de luz
seria ilusão aquela estrada sem destino?

pequenos passos
rapidamente guardados nos instantes
horizonte insatisfeito
sem asa de poema por cúpula
sem som de flauta por chão

mas eis que aconteceu…
a pequena chama que crepitava no peito
fez-lhe sentir o Sol à sua altura
e ela gritou
gritou-se!
erguendo bem alto os braços
como dois mastros de liberdade

depois já sem peso nos pés
já sem espinho na respiração
já sem véus de medo
chorou
e as suas lágrimas abraçaram
o voltar a ser a mulher
na manhã de uma íntima praia



Soares Teixeira – 10-02-2016
(© todos os direitos reservados)

"MISSA DO GALO". Machado de Assis - Soares Teixeira