segunda-feira, 27 de julho de 2015

"O POEMA ORIGINAL" - Soares Teixeira




Suspensa
a lua brilha
há nela um sorriso de milénios
fascinados
poderíamos ficar nesse repouso

mas…
 e quando
abrimos os reposteiros do olhar?
ah!
então aí
ela surge
- viva eclosão de esplendor -
sobre a mão do enigma
e aquilo que dela se liberta
e nos liberta
é um sangue de origem
um braço primordial
um sopro
de espaço para lá do espaço
de tempo para lá do tempo
de Ser para lá do Ser
inevitável
não sentir na boca
o pão do espanto
e o vinho da festa
inevitável não celebrar

nem espuma nem chuva
nem linha nem margem

apenas
o esvaziarmo-nos num ventre
e esperar que o vento dos promontórios
revele o poema original



Soares Teixeira – 27-07-2015
(© todos os direitos reservados)

domingo, 26 de julho de 2015

"AS MINHAS PORTAS" - Soares Teixeira




As minhas portas
abertas pelas palavras
do horizonte
e pelas mãos das distâncias
que crescem com o vento
e pelo mar
opulento reino de insondável sede

As minhas portas
abertas pela resina a deslizar
em árvores antiquíssimas
que transportam pelos espaços
cânticos de tempos
em que a verdade
vivia nas asas dos pássaros

As minhas portas
escancaradas
a barcos que assombram relâmpagos
a sonâmbulas gotas de orvalho
que deslumbram montanhas distantes
a búzios
consagrados a ilhas transparentes

As portas do meu corpo ausente
no dorso de cavalos alados
vão………. ..deixá-las ir
do peito
fica o olhar-te
e o ser-te oferenda
Sol



Soares Teixeira – 26-07-2015
(© todos os direitos reservados)

sábado, 25 de julho de 2015

"NA VOZ DOS PÁSSAROS" - Soares Teixeira




Na voz dos pássaros
eu
plátano
tu
acácia

e talvez assim fosse
talvez assim
crescêssemos em beijo
azul acima
rodeados de poetas
a celebrar mistérios
poetas de asas abertas
na intensa nudez do ar

algo acontecia
na superfície do sol
nascido do beijo
e as aves
ébrias de uma claridade
para além da memória
cantavam-no
deslumbrando a brisa



Soares Teixeira – 25-07-2015
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 23 de julho de 2015

"NA PRAIA" - Soares Teixeira




Ela caminha
como se fizesse parte
da história de uma nuvem
quem é?
pergunta o entardecer de Julho
não sei
respondo
e dou comigo a escrever
com o olhar
bela… bela… bela…

de movimento tatuado
ela afasta-se ondulando
e eu
transformado em peixe
sigo-a
sem esvaziar o copo do prazer



Soares Teixeira – 23-07-2015
(© todos os direitos reservados)

terça-feira, 21 de julho de 2015

"RETRATO"- Soares Teixeira




Estendo os braços
vivo as cores de mapas
que ondulam
na linha do horizonte

O mar deixa-me ser pássaro
assim me ofereço ao azul
aberto   
um dia serei álbum fechado

Pendurado na parede
do pensamento
o meu retrato
aquele que só o Sol conhece



Soares Teixeira – 21-07-2015
(© todos os direitos reservados)

segunda-feira, 20 de julho de 2015

"DESENCANTO" - Soares Teixeira




O deserto avança
dentro do labirinto
onde o bicho-Homem
uiva
à luz hipnótica
dum mundo
que finge ser o seu

abençoadas sejam as árvores
porque não puxam as nuvens
para dentro de pântanos
onde guardam as manhãs em combustão lenta
abençoados sejam os pássaros
porque não colocam o azul
em travessas de penumbra
onde sinistras noites mergulham os tentáculos

o bicho-Homem olha-se ao espelho
para dar forma ao vento
e abraçá-lo pela cintura
num prolongado gesto
de solidão a chover morte sobre a vida

em que barco
vão os paraísos inventados?

naufrágio
tudo naufrágio

salvem-se as aves
para que delas desça uma nova era


Soares Teixeira – 20-07-2015
(© todos os direitos reservados)