terça-feira, 16 de dezembro de 2014

"AO TOMÁS" - Soares Teixeira







“Mais alguém quer ler um poema?”
perguntou a liberta voz de um nó
mulher camélia de forja no peito
mãe de palavras de trigo feito pão para todos
“Eu gostava, posso?”
indagou o pequeno Tomás
naquela sala repleta de gente grande
que ali estava
dentro da sua roupa, dos seus sapatos
e dos seus mundos
para escutar a voz
de um nó de árvore, nó de pulso, nó de garganta
nó de Ser aberto à dança dos frutos mágicos
“Sim, claro!”
foi a resposta que floriu
e de repente
toda aquela gente grande ficou com a dimensão de um grão
e abandonou os seus sapatos e subiu no ar
e em leveza deixou-se levar na órbita da voz
de um pequeno grande sol
chamado Tomás
que na proa do seu navio-gente
foi a exacta medida da força necessária
para desatar o nó do silêncio
e assim nos estender o amanhã do navio-nação



Soares Teixeira – 16-12-2014
(© todos os direitos reservados)


(Nota: O Tomás é o menino que no lançamento do livro de Fátima Guimarães, “A voz do nó”, no dia 13-XII-2014, em Guimarães, leu um poema da Autora).

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

"ALVOROÇO" - Soares Teixeira







Neste alvoroço de viver
intensamente
a verdade silvestre

há mãos que são navios
e braços que são ondas
e ombros que são brisa
e bocas que atravessam as sílabas
e coxas feitas de palavras
e pés que são verbos
e o resto um pulso de horizonte
sem medida
que nos puxa para a plenitude do grito

nenhuma lucidez de espaço nos falta
nenhum vértice de silêncio
nenhuma espiral de água

aparece-nos claridade na pele
e erguemo-nos num luar só nosso
as árvores observam
do fundo das suas raízes
como a nudez da aliança
abre caminho
na sempre jovem
antiguidade da luz
e os pássaros dizem aos ventos
“O prodígio está ali”
sim é de nós que falam
e é por nós que chamam
os derradeiros unicórnios brancos
Olha! eles vêm!

é manhã nas asas de uma borboleta
e nela vai
o poema que somos



Soares Teixeira – 15-12-2014
(© todos os direitos reservados)

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

"AMOR" - Soares Teixeira







Amor

palavra retilínea
deslumbrada
com o destino das suas asas
brasa a crescer
dentro do instante liberto
que somos
transparentes como frutos
íntimos da alma do ar
cálida palavra inacabada
que viaja
de boca em boca

Amor



Soares Teixeira – 12-12-2014
(© todos os direitos reservados)



quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

"SEM MUROS" - Soares Teixeira







Sem peso no sol do ser

é bom
dizer adeus às esquinas
e ao fogo
que não se sabe deslumbrar
é bom
respirar a emoção
da iminente viagem
e depois sentir
as cores do percurso
libertas por alguém
que quer inundar
outro corpo
como céu
que se estende
para romãs no além
é bom
e é bom o mel de retribuir

sem instante e só instinto
cintilantes somos
e é bom ser
frenesim de magia
luz de sangue liberto
verdejante volúpia
aquática dança
de peixes em sede liquefeita

é bom erguer aos astros
as puras taças
que somos
de matéria por descobrir
de formas por inventar
de alvoroço de início
onde nenhuma argila
é ignorada
é bom brindar
à insónia do desejo

sem muros na fantasia



Soares Teixeira – 10-12-2014
(© todos os direitos reservados)

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

"O QUE IMPORTA" - Soares Teixeira







De onde veio esta água
onde somos navio?
de onde veio este céu
onde somos caule de além?
não sei
nem importa
não importa
o arco da pergunta
ou a curva da resposta
o que importa
é esta planície
onde caminhamos
na construção de um palácio
sem paredes, nem tetos, nem chão
apenas lugar
em nós
arquitetura sempre diferente
concebida pelo beijo
construída a partir do gesto
palácio perfeito
para lá do tempo
para lá da razão
o que importa
é esta sede incandescente
de desejo´
é sermos nós
apenas
e tanto



Soares Teixeira – 08-12-2014
(© todos os direitos reservados)

domingo, 7 de dezembro de 2014

"A ÚNICA LEI" - Soares Teixeira







Havia sol na sala
na valsa do beijo
desabotoámos
o nosso secreto poema
e as palavras caíram no chão
chegara o instante
de libertar tigres e açucenas
deitámo-nos então
para entrançados
sermos a única lei
depois
voámos
no tapete oriental
rumo aos abismos
onde espaço e tempo
se desnudam
desabotoando
os seus secretos poemas
assim libertando
palavras
no espaço sideral



Soares Teixeira – 07-12-2014
(© todos os direitos reservados)