sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

"TUDO MENOS BANAIS" - Soares Teixeira








Neste beijo
Um anjo lê um livro sentado numa nuvem
outro talha uma pedra num planeta distante
outro ainda passeia dentro dum raio de luz
onde há pinturas que abraçam olhares deslumbrados
outras procuram sílabas dentro das suas cores
e outras ainda são sempre um silêncio inacabado
neste outro
o olhar das águas assoma do enigma
a alma dos confins abre-se a todos os círculos
o fulgor das coisas divinas brilha numa borboleta
e perdidos são os ventos de si mesmos
e abertos são os caminhos das origens
e indivisível é a nascente da eternidade
e neste
acontecemos
como jardim de rosas ao luar
ao luar de cânticos que dançam
ao luar de seios cheios
de lua e desta viagem
minha e tua

somos tudo menos banais
momentos de oração, centauros, cachos de uvas
lágrimas de sóis, risos de flores embriagadas
outros espaços, outros pássaros, outras madrugadas
tudo menos banais
carnais apenas na ondulação



Soares Teixeira – 05-12-2014
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

"CLARIDADE" - Soares Teixeira








Luar pleno em ar de êxtase
e uma espada de sede
a vencer fantasmas de distância

o meu nome é mar
o meu gesto é de navio
o meu caminho é beber-te

claridade
anterior à asa e à pérola
claridade
anterior à flauta e ao silêncio
claridade
do suor sideral
e da seiva de infinito
claridade
no amanhã do pássaro
e na pedra entregue ao grito
claridade
a oscilar nas árvores
claridade
a inundar as bocas

desejo pleno a crescer em mel
flor de nuvem
no vulcão das veias

o meu instante és tu
puxo-te e guardo a arma no olhar
vem!
a hora é de exílio no incêndio



Soares Teixeira – 04-12-2014
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

"CONVITE" - Soares Teixeira







Olho-te

por trás da forma
está a estética do inexplorado
por trás do gesto
está a órbita da polpa
recosto-me numa almofada
que quer conhecer o meu calor
não sei em que palavras tenho a boca
nem em que argila tenho os dedos
moldo-te em música
hum…
que bom ser felino e poder voar
sabes…
tens um pijama igual ao meu
feito de desordem, sede e ar
aqui e ali o desenho de uma ilha inventada
que tal se nos despíssemos
para nos cobrirmos com o manto
de sedosa incandescência
que nos oferece aquela deusa
que caminha na praia do luar?



Soares Teixeira – 03-12-2014
(© todos os direitos reservados)

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

"O DIA DA REVELAÇÃO" - Soares Teixeira








Creio
que nunca vês
as asas
nas minhas costas
quando escreves o meu nome
na forma como danças
dentro das palavras
de onde me chamas

vem
amo-te

e eu
colibri de fogo
vou
rápido
porque menos que isso
seria insuportável lentidão

mas hoje
não sei porquê
talvez
por me sentir
ânfora a derramar vinho lunar
sou lenta brasa
na intimidade dos mitos
e
touros sagrados
véus enfeitiçados
navios enamorados
rodeiam-me
envolvem-me
com coisas de mistério
e
embriagado de uma nova respiração
sou
de braços abertos
vagar
a rodar no meu eixo de desejo
hoje
em mim a revelação
hoje
próximo da chuva
que ainda não desceu do sono
asas beijam
o sorriso onde danças
de admiração



Soares Teixeira – 02-12-2014
(© todos os direitos reservados)

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

"O SAXOFONE" - Soares Teixeira








O mundo
era o recanto de um bar
jazz como céu
cocktails como sol

E porque o mundo
é fecundo e nosso
aconteceu

Já não sei de que luar
eram feitas as rosas
que ascenderam
do fogo
com que seguraste
os meus lábios
com os teus
recordo-me
que um peixe
saltou
de um para outro mar
e sei
que em ti
fui beijo
em espiral de ar

Mais tarde
com o som do saxofone
ainda presença nua em nós
fomos como ele
puros
lembras-te?
puro gemido
a uma só voz



Soares Teixeira – 01-12-2014
(© todos os direitos reservados)