Fotografia de Sven Storbeck
Foi no meu automóvel
que nos enamorámos
pelo rumor da distância
aquela que se adivinhava
nos teu olhos de subtil volúpia
e nos meus de pavão real
e aquela outra
a que unia lugares
a nascer dos nossos dedos juntos
num ponto no mapa
dedos que escorriam e sorriam
aventura
Vamos aqui? Vamos!
e lá íamos
abertos ao sempre inicial
som do motor
sobre quatro rodas que rolavam
como se inventassem a estrada
sempre com a música do rádio
a saudar rectas, curvas e colinas
que nos acenavam como criaturas
que o meu automóvel libertava
do seu anónimo tédio
Às vezes o volante queria ser teu
porque não?
gostava de me sentir sultão
conduzido por uma gazela encantada
De noite os faróis eram estrelas
e a tua cabeça uma lua
colada ao grande planeta
que era o meu ombro
Quando parávamos
para um beijo à beira de uma falésia
uma caminhada por entre flores campestres
ou um lanche no café de uma praça antiga
ele ficava familiarmente a observar-nos
silencioso, contente
e também um pouco vaidoso
retribuíamos-lhe com um sorriso
lembro-me que uma vez lhe deste um beijo
e eu com ciúmes te prendi pela cintura
ele também se lembra disso
o meu automóvel
Soares Teixeira – 30-03-2014
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