quarta-feira, 12 de novembro de 2014

“AH SIM, SER!” - Soares Teixeira







Ah sim hei-de ser gôndola em Saturno
onde o meu navegar será nascente
de sonhos de nudez resplandecente
na frescura da luz de um sol nocturno

taciturno bosque
de onde o verde está ausente
bosque cinzento em cinza de gente
diurno hás-de ser

porque hei-de ser azul olhar de flor
porque hei-de ser sul em salto de rã
hei-de ir embora sim ir rumo à cor

far-me-ei romã sim     Ah sim, ser!
deixarei a dor de triste bosque
a gritar amanhã em gruta de agora



Soares Teixeira – 12-11-2014
(© todos os direitos reservados)

domingo, 9 de novembro de 2014

"TERTÚLIA" - Soares Teixeira




Foto de Mafalda Lobo. Tertúlia "As nossas palavras". Café Martinho da Arcada, 07-11-2014



Agora sou eu
é a minha vez de ser palavra
com coluna vertebral e músculos
e estendo o poema
em movimento de ondulante unidade
como se estendesse um lençol
sobre a relva recém-nascida
de um instante que me leva às cavalitas
brancura onde me sinto inicial
voz em mim a corar ao sol
Agora és tu
é a tua vez de soltar luares ao vento
verbos que voam
sentados à garupa de versos
com cascos de ouro
quadris incandescentes
e infinitas crinas de luz
e estenderes-te em palavra
até às veias dos silêncios ausentes
e neles celebrares o Pégaso da poesia
Agora somos nós
folhagem da grande árvore mãe
irmãos nos mistérios e na alegria
a caminhar nas distâncias
que a partilha mantém intactas
silabas em gozo de céu a brilhar
nos olhos com que brindamos
o sermos todos o poema maior
o sempre frondoso início
da liberdade numa manhã em flor



Soares Teixeira – 08-11-2014
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

"DIVERTIMENTO" - Soares Teixeira







Sinto-me canção

Voa em nós
um começo de viagem futura
A minha respiração
é dizer adeus aos instantes
porque só tu és tempo
Estás a ver aquela nuvem
a passear-se serena e leve
como um verso a dormir a sesta?
sou eu
navio acabado de construir
praia a bater no coração de uma onda
gaivota a molhar o bico
no azul de uma pálpebra de horizonte
Compreendes agora
a escrita dos meus dedos
no olhar do teu corpo?
Vê se descobres
onde está a palavra flor
dou-te uma pista
está algures
na conjugação do verbo amar
tatuado pelo meu desejo
em toda a tua pele
quando descobrires
dá-me um beijo
aberto como este sol
que vês brilhar nos meus lábios

a sorrir-te em ré bemol



Soares Teixeira – 06-11-2014
(© todos os direitos reservados)





terça-feira, 4 de novembro de 2014

"LUTA" - Soares Teixeira




Ludwig van Beethoven



É sempre dia
de vestirmos o amanhã
com o desassombrado gesto
da liberdade

as aves gostam de sentir
que as igualamos
no êxtase de além
e elas não estão apenas
no coração do azul
existem também
dentro dos sonhos por nascer

a luz manda
a vontade quer
o punho voa
sempre



Soares Teixeira – 04-11-2014
(© todos os direitos reservados)

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

"OBSERVAÇÃO" - Soares Teixeira







Observo-te
a viver um lírio
Gosto de habitar
na flor que tentas decifrar
e nela ser
de braços abertos
o dia mais completo
o ponto de exclamação
de um olhar de rio sem horas
a saliência de uma rocha de vento
uma proa de estrela cadente
a respiração de um salto equestre
tu vens
olha     como caminhas
volátil
inicial
névoa que nasce
consciente inconsciência
crescente procura de uma chave
para o mundo
e para o teu mundo
olha     como te alongas
em tentativa de compreender
o mistério do lírio
aproximas-te
e eu
a sentir o sangue urgente
rapto-te
da ilha do teu instante
para o meu sonho
de ser
o teu navio vegetal




Soares Teixeira – 03-11-2014
(© todos os direitos reservados)