Acontece por vezes
que se caminho alheado
de tudo o que não seja
a minha paisagem de deveres
próprios de roda dentada
do mecanismo social
e o acaso me faz reparar
numa flor com que me cruzo
descubro
que ela me pode estar a chamar
que pode haver surpresa nos meus passos
e abrando o movimento
das engrenagens daquilo que penso valer a pena
e fico com a convicção de que também vale a pena
saudar
sorridentes balões coloridos,
caravelas nos mares da Lua,
baloiços a cintilar nos astros,
castelos feitos de manhãs e asas,
árvores em danças de roda,
cânticos na superfície dos lagos
como me acontecia quando eu era menino
e a minha pátria eram horas cheias de luz
e mundos dentro de flores
nesses momentos
há não sei que veleiro em mim
que me leva
leva…
e eu vou
e deixo-me em liberdade
largo esse pássaro em que me transformo
e deixo-me voar
desde a raiz da flor
até à alegria das pétalas
e vou mais longe ainda
e faço adeus a cometas
que se julgam atrasados
para a grande festa do infinito
e isso é bom
são boas estas ofertas
que recebo de mim mesmo
é com elas que adoço o café
não uso açucar
Soares Teixeira – 27-11-2016
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