quarta-feira, 4 de maio de 2016

"NOCTURNO" - Soares Teixeira



De rosto encostado aos astros
dois pensamentos
na boca do olhar

ser espaço
para sobreviver à morte?
ser frase
para sobreviver aos dias?

duas perguntas
dentro de uma rosa
sobre o teclado de um piano



Soares Teixeira – 04-05-2016
(© todos os direitos reservados)

"ESTRANHA VIAGEM" - Soares Teixeira



Estranha viagem
isto de ser parte do todo
que parte?
a mão que acaricia a nudez da flor
ou a mão que descansa numa galáxia?

dentro da espessura
de todas as realidades, físicas ou não
sou uma linha tão ténue, tão fugidia
que por vezes penso se não serei um simulacro
uma transparência a tentar ganhar corpo entre os astros
e alma entre as árvores

as minhas ideias são telescópios e microscópios
para me tentar encontrar
às vezes, quando os acho grandes de mais para os meus braços
ou pesados de mais para as minhas pálpebras
abro a primeira janela em que penso
e vou voar para lado nenhum

e olhem que é bom voar para lado nenhum
enterrar os pés na areia de uma praia sonhada pelas gaivotas
e caminhar
sobre a voz de um início
sob a voz de um início
dentro da voz de um início
sabendo que tudo está na fronteira do fim
e do recomeço
tudo
mesmo tudo
o que é e o que não é

se eu fosse feito de espuma
rente ao vento
não habitava palavras a falar consigo mesmas
mas a parte que me coube ser neste todo
é este teimoso amanhecer nas ruas da minha imaginação



Soares Teixeira – 04-05-2016
(© todos os direitos reservados)

segunda-feira, 2 de maio de 2016

"A MÃO" - Soares Teixeira



Com um olhar feito de antes
e outro feito de depois
sou este agora

um Ser que vai sendo
navio com proa de carne
e água do cântaro da hora

tudo reminiscência
tudo realidade
e cada desejo
um balão solto de uma mão
a subir no espaço
rumo a outra mão
lá no alto
aberta
a brilhar



Soares Teixeira – 02-05-2016
(© todos os direitos reservados)

domingo, 1 de maio de 2016

"UNIÃO" - Soares Teixeira



Em mim
um banco de jardim
do outro lado do espaço

nele alguém sentado
com uma flor no regaço
é minha mãe antes de eu nascer

observo a esperança que fui
e o cravo que hei-de voltar a ser
no regaço de outro amanhecer



Soares Teixeira – 01-05-2016
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 27 de abril de 2016

"QUE SOMOS NÓS?"



Somos uma voz do acaso?
um acaso na voz?
que somos nós?

ínfimas centelhas
de sonho e alento
sempre, sempre e sempre
de descoberta em descoberta
de firmamento em firmamento

garganta solar
gesto de mar
que somos nós?

sempre pergunta
sempre resposta
sempre além
sempre a correr no círculo
sempre vértice de triângulo
sempre outro ângulo
sempre asa de aquém

que somos nós,
ínfimas centelhas
do momento?



Soares Teixeira – 27-04-2016
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 21 de abril de 2016

"FICAR LONGE" - Soares Teixeira



Há dias em que as palavras não querem ser oferendas ao pensamento e o que apetece é não pensar em nada, absolutamente nada. Para quê pensar se tudo é irreconhecível? Antes o vazio, o nada. Lá ao menos não há sede de sangue, nem cavalos atravessados por lâminas de medo, nem gargantas onde serpentes celebram a morte de veias livres. O vazio….. o nada….. sem centro ou periferia, sem começo ou fim, sem luz ou sombra ….. o vazio ….. o nada ….. apenas ….. e tanto. E é tanto o que existe quando a respiração pode ser leve, leve, leve, levíssima, mais leve qualquer punhal a aguardar a hora de ser riso de hiena a celebrar traição. Ficar numa ausência, num tempo incerto, num espaço ocupado não pelo corpo mas pelo espírito – liberto de todos os caminhos, de todas as origens, de todo o horizonte. Ficar longe, bem longe do hálito de latrinas vestidas de seda.



Soares Teixeira – 21-04-2016
(© todos os direitos reservados)