sábado, 12 de março de 2016

"PEDIDO" - Soares Teixeira




na brisa côncava
o poema brinca
com o seu pião
até que um olhar de astro
lhe pede
para ser o azul das aves



Soares Teixeira – 12-03-2016
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 10 de março de 2016

"AMORAS" - Soares Teixeira




Manhã
mundo em sossego
o ar é alegre

todas as nossas vértebras
são musicais

as amoras expandem-se
no olhar do desejo

sem receio
comemo-las
em lento beijo


Soares Teixeira – 10-03-2016
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 9 de março de 2016

"ANIVERSÁRIO" - Soares Teixeira




Hoje recordo
que havia um espaço
feito de prodígio
cheio de poema líquido
onde o milagre era total
nele em cada segundo
às minhas veias
chegava a força dos astros
nele eu era o ser e o não ser
depois nasci
fiz-me gente, árvore, mar
e navio
em busca dos pulmões da palavra
agora
aqui vou estando
diante do Sol
até que um dia
calçe as sandálias
do último silêncio


Soares Teixeira – 09-03-2016
(© todos os direitos reservados)

terça-feira, 8 de março de 2016

"MULHER" - Soares Teixeira




Mulher
ancas de chão e céu
seios anteriores ao tempo
ombros de horizonte e sede
mulher
do templo solar à nudez do mar
do segredo da argila ao eco do fruto
da renda do olhar ao relâmpago do ventre
mulher
início, centro e medula
da humanidade
regaço, diapasão, ilha lunar
mulher
ribeiro nos lábios da manhã
navio com proa de luz
nome escrito no celeiro da eternidade



Soares Teixeira – 08-03-2016
(© todos os direitos reservados

segunda-feira, 7 de março de 2016

"BRINDEMOS" - Soares Teixeira




Dos gestos convertidos em garganta
cresce o desassossego
de sílabas
de espera em flor
que se juntam
para a sagrada consumação do mais além
e assim nascem
as palavras
céu prometido pelos deuses
aos seus filhos dilectos

gratos cantemos
gratos dancemos
gratos celebremos em poesia
essas asas tão íntimas dos astros

o poema é gesto de marinheiro
quando leva a mão à testa
para observar o mar
o poema é gesto de lavrador
quando coloca as mãos sobre os rins
ao observar a terra
o poema é gesto de criança
quando aponta o sol
na cúpula do olhar materno
o poema é o sermos pássaros
na grande festa da descoberta

abram-se as portas
abram-se as portas à liberdade
aos gestos convertidos em garganta
aos dedos convertidos em voz
e juntos brindemos
às praias do infinito



Soares Teixeira – 07-03-2016
(© todos os direitos reservados)

domingo, 6 de março de 2016

"HOJE ESTOU ASSIM" - Soares Teixeira




a poesia poderá estar nos misteriosos acordes de um piano transparente, nos súbitos frutos libertos de todos os princípios e de todos os fins, nos gritos dilacerados das tempestades, na chuva que cai sobre telhados de cidades onde a lentidão das noites torna fantásticos os seus recantos mais infectos, na insónia de rios que a todos os instantes passam pelos gestos com que os barcos os afagam, no estrépito de cor de flores silvestres, no inexplorável ócio com que a névoa se afasta de caminhos guardados no extremo da fragilidade, no ondulante e aveludado silêncio com que as algas dizem que sim e que não a peixes submersos em pensamentos surpreendentes e jamais acessíveis a pássaros de asas guardadas em casacos cinzentos. Sim talvez a poesia ande por aí… talvez esteja por aí, a poesia… na vertigem, na viagem, no murmúrio, nas lâmpadas e nas rosas, nas coisas todas, na matéria e na antimatéria… talvez ande por aí – anda certamente… anda. Que ande! A poesia que neste momento eu quero é aquela que está no olhar de um cão quando sabe que o seu amigo de duas patas morreu. Essa é a poesia que eu quero. Mais nada. Hoje estou assim. Prometo a mim mesmo que amanhã a mágoa já não será cigarra. Por agora mais não posso fazer.



Soares Teixeira – 06-03-2016
(© todos os direitos reservados)