terça-feira, 29 de dezembro de 2015

"COMO AS ÁRVORES" - Soares Teixeira



Diante de mim uma árvore
o seu sorriso
visto de frente
ou de qualquer ângulo
tem o mesmo rio
e o mesmo estuário
sem aquela vil brancura
encardida
que vejo no rosto de alguns animais
racionais…
sim…racionais…
mas nódoas na mesa de qualquer céu

antes o vinho derramado por falsos deuses
que os conspurcados sons
de uma lira tocada por gente de escamas ocultas
antes a flacidez de velhas prostitutas
que o aprumado gesto
da obscena malícia dissimulada

como as árvores!
como as árvores… sim…
como as árvores é que deviam ser
em árvores é que se deviam transformar
os que se contorcem em volúpia de mentira
e crescem em volutas de pântano e presunção

se enquanto gente
apenas sabem rastejar e rasgar gente
então que se transformem em algo decente
e árvores sejam
árvores… sim…
frondosas e sem recusar ramos aos pássaros




Soares Teixeira – 29-12-2015
(© todos os direitos reservados)

sábado, 19 de dezembro de 2015

"REFLEXÃO"




Como se chama aquele deus
que nasceu, viveu e morreu
dentro do seu próprio teatro?

Orgulho
murmura uma voz curvada
que se esconde num canto do peito

E o tempo passa
inútil querer ser mais que água
tudo é rio


Soares Teixeira – 19-12-2015
(© todos os direitos reservados)

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

"NUM SECRETO TERRAÇO" - Soares Teixeira




Num secreto terraço
feito de um mármore de olhar e asa
e que se estende a um antes e depois
deste livro onde somos escritos
caminhar
lentamente
ser a espera, ser a porta
e ser o choro que escorre da chama
e ser também
veludo e aço
e estátua que emerge de chão nocturno
e sol a brilhar nas colunas dos séculos
e perguntar a um astro
que anda perdido no peito:
sou um copo pensativo
a rodar nos dedos do vento?
sou o corrimão de bronze cinzelado
de alguém que vive a máscara
do ser e do não ser?
sou a água de que vigília? De que sono?

Num secreto terraço
sabermo-nos
um além vitória e além derrota
um além certeza e além erro
um além e aquém  luz
além momento

Num secreto terraço
sabermo-nos
pálpebra nunca satisfeita
com o aproximar das coisas
e escapar
- fugir

Fugir
dentro de um poema
ser astronauta
ver outros mundos
descobrir-lhes as manhãs
e nelas  recomeçar



Soares Teixeira – 18-12-2015
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

"O TEMPO VIRÁ" - Soares Teixeira




Algum dia
num astro
vivi
o ser peixe
a nadar dentro de mim
e ser pássaro
a voar para outro fim

depois acordei
ou adormeci
não sei
e vim dar comigo
nesta sede de azul

o tempo virá
em que regressarei
à água que serpenteia na luz
e então sonharei
com o carro solar
que agora me conduz


Soares Teixeira – 08-10-2015
(© todos os direitos reservados)