Dizer um poema
é ir ao seu encontro
colocar-lhe uma flor na lapela
e depois dizer
“vem
entra na minha janela
alonga-te nas minhas ruas
e nos meus segredos
caminha no chão que encontrares
se quiseres dançar dança
se quiseres cantar canta
se quiseres gritar grita
talvez me encontres num instante
em que me apeteça fazer a mesma coisa
ou talvez não
podes demorar a fazer sentido no meu sentir
e eu ter dificuldade em me misturar
com as tuas palavras
ou podemos ser imediata posse mútua”
Às vezes o poema incendeia as veias
outras vezes é uma nuvem triste
com gente dentro a chorar por dentro
o poeta
ah sim quantas vezes
tatuado a exílio
ilha a forçar a porta do sol
e de página sonâmbula no olhar
o poeta chora a força que tem de fazer
para sustentar o telhado do ser
poeta
mereces que te digam
“vem
entra na minha janela
alonga-te naquilo que encontrares
queres passear apenas? Passeia
queres apascentar um rebanho? Seja
queres conversar? Sim, sejamos búzios
se quiseres podes descansar
senta-te um pouco na natureza do meu mundo
estender-te-ei um pano branco
tecido com as linhas da minha condição
dar-te-ei a beber um pouco da minha alma”
Creio que o mar habita todas as metáforas
e a vida por ser mortífera tem saltos altos
e as casas são a efémera polinização dos seus espaços
e tudo acaba por ser geografia em processo de descoberta
por isso
não aos poemas parados no silêncio
não aos poetas longe da mesa das suas palavras
“vem poema
vem
porque eu vou ao teu encontro
há em mim um rio falante
e nele uma flor
para te colocar na lapela
vem poema
vem
entra na minha janela”
Soares Teixeira – 22-04-2015
(© todos os direitos reservados)