domingo, 15 de março de 2015

"MARÇO" - Soares Teixeira





Março
mês de começos
mês de portas abertas
manhãs de cara lavada
a sorrir ao mundo
tardes que se prolongam
nas conversas das flores
Em Março
a Primavera já são peixes
a saltar nos dias
Foi em Março
que eu José nasci
para estar aqui
a voar
a dizer
que cada árvore
é uma aldeia em festa
que tudo o que vive
é parente entre si
que o mar
abre os olhos da vontade
e que no ar
estão os beijos da liberdade



Soares Teixeira – 15-03-2015
(© todos os direitos reservados)

sábado, 14 de março de 2015

"UMA E OUTRA VEZ" - Soares Teixeira





Ah este incrível sermos ondas a rolar
uma e outra vez sem longe sem perto e sem medo
sendo tudo o que em nós se amontoou em segredo
e que agora é simplesmente o sermos luar

luar de marinheiro
e quem é esse marinheiro?
Ah é o tempo parado na proa deste veleiro
deste beijo onde somos ondas a rolar

luar de ondas a rolar duas vezes três vezes quatro vezes
com os braços e as pernas a rir   a rir   a rir
achados e perdidos e novamente achados na agitação
deste mar de tamanho inconcebível     sideral    

Ah     rolar     beijo     redenção
uma e outra vez sempre véspera vertical
do incrível     em ascensão
uma e outra vez sempre inicial



Soares Teixeira – 14-03-2015
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 12 de março de 2015

"CÉU" - Soares Teixeira





Há dias em que o poema que apetece
é o céu
azul simplesmente azul
azul contínuo
sem estar pespontado a fios de ideias
azul da proa à popa do olhar
apenas um ou outro pássaro
levando consigo aquilo que alguém sonhou
num tempo em que não havia aviões

Ficar à porta do ombro e contemplar o vestíbulo
da eternidade
sem relógio para estorvar a liberdade

Desatar os tornozelos
e lançar fora os instantes
para ser azul
azul simplesmente azul

Ir
ser alto-mar do único poema apetecível
o céu
ir
ganhar altura
até conquistar a asa do Eu
asa azul da hora futura



Soares Teixeira – 12-03-2015
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 11 de março de 2015

"CÔNCAVO" - Soares Teixeira





Despertar

ser côncavo
para receber
a força da água da luz
e a força da luz da água
num adeus
às bocas de cantos erguidos
que não disfarçam
as seringas infectadas
e às bocas de cantos dissimulados
que não disfarçam
a ferrugem dos ferrolhos
côncavo
como um lugar
que se escreve
no livro do peito
côncavo
como aquele albergue
de veias e músculos
que mais ninguém conhece
só nós
câncavo
para compreender
como pode a mentira
ter mãos enormes
e calçar luvas de criança
sim côncavo

porque as pérolas não nascem
do ventre de rosas cantadas



Soares Teixeira – 11-03-2015
(© todos os direitos reservados)

terça-feira, 10 de março de 2015

"COMBOIO" - Soares Teixeira






Há um azul num desejo de espaços
e uma luz sem sono
num instante sempre inicial
há uma intimidade suspensa
e um céu sempre aberto
numa ilha dentro de mim

E há esta unidade
este ser igual
aos mistérios onde fui gerado
e esta inquietação
este estar no pensamento
como se nele florescesse todo o além

E tudo isto acontece
enquanto observo um comboio
dentro dum tempo distante
comboio onde da minha janela
eu via feliz o mundo passar
comboio que me deixou aquém



Soares Teixeira – 10-03-2015
(© todos os direitos reservados)