quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

"OLHÁMO-NOS E DEIXÁMOS DE FUJIR" - Soares Teixeira



Olhámo-nos e deixámos de fugir
nas nossas pupilas descobrimos erva fresca
a cumprir promessa
aos nossos sentidos chegaram conchas
que julgávamos não existir
Tranquilamente saímos pelas janelas
dos nossos lábios
e reunimo-nos num abraço
que encheu o copo do instante
Roubámos o cobre ao sol
o mármore aos deuses
e as alfaias aos camponeses
para tudo em nós
ser início solenidade e sangue novo
e naquele fim de tarde
oferecemo-nos
a todas as romãs
a todas as cortinas levantadas
a todas as flautas lunares
a todas as bandejas de sonho
a todos os lagos e palmares
aos ventos de todos os lugares



Soares Teixeira – 15-01-2013
(©todos os direitos reservados)

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

"A TAÇA" - Soares Teixeira

Taça de Nestor, Museu Arqueológico de Atenas




Todos os amanhãs nascem hoje
a herança dos instantes
está na espuma de outras praias
Partir
do centro do peito
do cais do espanto
do terraço da pupila
Partir
nem que seja
rumo à miragem
que atravessa o olhar
Partir
provar o sabor do vento
aspirar o perfume do instante
sentir o horizonte nos pulsos
Partir
ser seiva
ser fruto
ser madrugada
Partir
apenas com uma taça na mão
para brindar à Terra
que é sagrada
Partir
apenas com uma taça na mão
para beber palavras
sempre que os lábios estiverem secos
de sonho e ilusão



Soares Teixeira
(©todos os direitos reservados)



domingo, 23 de setembro de 2012

Elsa Rodrigues dos Santos



Elsa Rodrigues dos Santos deixou-nos. Mudos e petrificados ainda estamos no aconchego do seu sorriso, ainda caminhamos dentro do seu olhar, ainda nos erguemos ao escutar o timbre da sua voz. Deixou-nos a grande matriarca, a incansável líder, a imensa coluna, a amiga, a sábia. E agora? agora somos pedaços de abóbada a cair. Olhamos em volta, estendemos as mãos e ela já não existe para nos receber e nos amparar. E agora? agora ficámos aquém de nós mesmos, a palpitar nervosamente no desalento. E agora, as nossas asas?
Adeus minha querida Amiga. Fizeste-nos felizes. Agora está frio.
Adeus.


Soares Teixeira

domingo, 9 de setembro de 2012

"CONTINUAMENTE" - Soares Teixeira




O universo escreve-se
continuamente
para nunca ser decifrado

os homens
fazem rufar os seus tambores
e disparam espanto e conquista
mas as suas setas
ficam sempre aquém

o tempo aplaude
a distância grita
a luz vai

equações demonstrações
deduções dissertações
sucedem-se
nas asas de insectos
em núpcias com o sonho

e sempre um poema
no pólen do enigma




         Soares Teixeira – 05/08/2012

terça-feira, 4 de setembro de 2012

"INÍCIO" - Soares Teixeira





De todas as direcções do universo
surgem olhos
confirmando a nascente do poema
fico quieto, em silêncio
observando
o meu corpo apenas existe
dentro da respiração
o instante
está num casulo

belo
simples, solene e sagrado
o sol nasce
alonga-se o meu espírito
saúdo o milagre
visto as suas asas
e em mim
sou o senhor
de tudo o que quero amar

                                              Soares Teixeira

sábado, 1 de setembro de 2012

"VERDE QUERO-TE VERDE" - Soares Teixeira




Verde quero-te verde
sagrada floresta
delírio de gestos
que transbordam
do meu abraço
em balanço de êxtase

Verde quero-te verde
sublime milagre
que se ergue da terra
e em beijo mergulha
nos céus
esfomeados de paraíso

Verde quero-te verde
templo de prodígio
aberto à oração
dos que te amando
crescem
na distância de si mesmos

Verde quero-te verde



                                                  Soares Teixeira - 24/08/2012

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

"SANTA MARIA MANUELA" - Soares Teixeira




Santa Maria Manuela
é uma alma em corpo de veleiro

Branco
do cais de cada instante
saía para o templo azul
erguido na pétala da distância
Santa Maria Manuela
o bacalhoeiro
Belo e de proa triunfante
segredava ao mar
pela voz das velas
as viagens do pensamento
dos que nele navegavam
vestidos de vastidão e vento

Triste
um dia parou
à grande porta do tempo
como um fim de tarde sem júbilo
Santa Maria Manuela
quase grito derradeiro
Ferido e a sangrar
era um estranho animal
que em surdina chamava
pelo azul dos sonhos
a cintilar
no rosto de Portugal

Abertas
como grandes asas de vontade
mãos em manhã de aventura
lançaram-se firmes
para salvar a taça tombada
no altar do destino
e cada homem era um menino
no assombro de ser mais
que o brilho de um sonho
entre a folhagem de um jardim
cada homem era o azul
de que o horizonte se alimenta

E aconteceu
o futuro renasceu
branco

Santa Maria Manuela
alma em corpo inteiro
Santa Maria Manuela
o veleiro



Soares Teixeira / 04-08-2012