terça-feira, 26 de maio de 2015

"COMO BEBER O POEMA" - Soares Teixeira





Voar até ao fim da asa
depois cair no chão da palavra
que é céu

voar para lá do derradeiro gesto
levar água para o vazio
e nele ser ilha com olhar de navio

dar a mão à noite
 e ir devagar devagarinho
com passos de coisa nenhuma

então, numa secreta nudez de viagem
continuar a beber o poema
com lábios de sol



Soares Teixeira – 26-05-2015
(© todos os direitos reservados)

segunda-feira, 25 de maio de 2015

"A ÚLTIMA TULE" - Soares Teixeira




(Tule como Tile na Carta Marina de Magnus)


Aqui estou
neste azul de ser gaivota
com o mar dentro do peito

venho da raiz da distância
e vou em linha de leveza
sempre início de outro lugar

e assim serei
até um dia chegar
à Última Tule



Soares Teixeira – 25-05-2015
(© todos os direitos reservados)

domingo, 24 de maio de 2015

"ESTRADA DE DAMASCO" - Soares Teixeira



(Caravançarai de Sultanhan, Turquia)


Sabes,  poema
és o sangue de quem  te escreveu
mas também o meu
porque é nas veias que te recebo
meu poema
ave que me conduz
claridade que me converte à luz

leio-te
e em ti vou
viver-te
meu poema

minha Rota da Seda
minha jornada
minha alegria por habitar outros instantes
meu corpo de horizonte
minha caravana com suas maravilhas
meu tilintar de metais na fímbria do vento
meu oásis onde bebo água fresca
meu caravançarai
minha Estrada de Damasco
meu poema



Soares Teixeira – 24-05-2015
(© todos os direitos reservados)

sexta-feira, 22 de maio de 2015

"INAUGURAIS" - Soares Teixeira





Nus
despiram o luar de todas as palavras
e fizeram o mesmo com o corpo
nudez total

deitaram-se
o silêncio nascia da noite
as ondas dormiam no mar
e eles inaugurais

amaram-se
sem que os espaços se importassem
e assim libertaram
a madrugada por acontecer



Soares Teixeira – 22-05-2015
(© todos os direitos reservados)

quinta-feira, 21 de maio de 2015

"ABSOLUTO" - Soares Teixeira





Quando os pássaros
ficam em silêncio de asa
é bom observá-los
lentamente
numa lentidão completa
deixar
que o peso do corpo
seja um segredo do horizonte
que a pele se torne
finíssima respiração dos espaços
e que o gesto
seja aquele que o vento quiser

intimidade
absoluto a viver nas veias
límpida liberdade



Soares Teixeira – 21-05-2015
(© todos os direitos reservados)

quarta-feira, 20 de maio de 2015

"ARGILA" - Soares Teixeira




Existe
ainda universo em mim
um rumor de início

existe sim
vive comigo
dentro desta argila de fim

cresço em pensamento
e o fruto
pergunta à árvore

que insuspeita manhã
guardo no rio do Ser?
que entardecer?  

em que sono de luz
dorme a brisa que fui?
a que sonho chegarei?


Soares Teixeira – 20-05-2015
(© todos os direitos reservados)

terça-feira, 19 de maio de 2015

"UVAS" - Soares Teixeira




Frente a frente
sentimos na medula
do olhar cruzado
um cacho de uvas
suspenso sobre a água
de luz eterna

fecharam-se os lábios
de todas as palavras
excepto os das nossas
abertas
em terra fértil
e mar sem onda de dúvida

este é o meu corpo
está pronto para ser a grande porta
entra

este é o meu corpo
está pronto para ser o horizonte da carne
entra

dissemos
em beijo
ao comermos lentamente
as uvas
uma após outra

depois
poema incandescente
entregámo-nos
ao sangue dos astros



Soares Teixeira – 19-05-2015
(© todos os direitos reservados)