(Andorra, 13-08-2014)
Aqui me têm, montanhas
diante de todo o além que libertam
e de todo o além que ocultam
aqui me têm
no primeiro momento dum silêncio
que se completa
no primeiro momento dum olhar entoado
pela leveza
no primeiro momento dum sentir
infância nos espaços
no primeiro momento duma outra dimensão
que se abre
corpo?
sim tenho um corpo
e ele é o vosso convés, montanhas
e ele tem a pele dos lagos
e ele tem o cântico das árvores
e ele tem o gosto a céu
ele é o caminho que pertence aos
caminhos
e é neste corpo que partilho convosco
que cresce a hera da unidade, da
unanimidade, do absoluto,
do imemorável, do inominável
O que me rodeia afinal?
o que habita o íntimo murmúrio da
placidez que me recebe?
o poema
com astros no lugar dos olhos, distâncias
no lugar dos lábios,
sede nos arcos dos gestos,
Diante de vós o que sou?
centro e orla; de presença e
ausência, de princípio e fim
flor ancestral de pétalas estendidas
no tempo
polpa de êxtase e fronteira para
lá dos dias
uma nota mais na partitura do
eterno
Saúdo-vos, irmãs montanhas
e porque viemos do mesmo cataclismo
cósmico
ascendo dentro da boca da palavra
e a palavra é verbo
e o verbo é renascer
renasço, renascemos
o vosso respirar é o meu
e com a veemência do instante que ilumina
a viagem
olho-vos para lá da liberdade de
olhar
olho-vos e sou pássaro que vos
leva nas asas
e juntos voamos rumo à incandescência
da primeira sílaba
Espera-nos a frescura do sol
inicial
Soares Teixeira – 17-08-2014
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