domingo, 5 de fevereiro de 2012

"SÓ NÓS PRÓPRIOS" - Soares Teixeira




Só nós próprios nos podemos reconstruir
ninguém é interior aos nosso medos
ninguém respira a nudez da nossa solidão
ninguém conhece os muros do nosso labirinto
Só nós próprios gesto a gesto palavra a palavra
podemos ser oferenda aos nossos abismos
e atravessar o impossível para nos reunirmos
à esperança dos céus matinais
Só nós próprios podemos pintar de branco
a casa do nosso combate
e plantar a claridade no jardim do amanhã
só nós impiedosamente nós próprios


Soares Teixeira

sábado, 4 de fevereiro de 2012

"OLHEI-TE" - Soares Teixeira



Olhei-te
do convés do meu olhar
e vi-te
estavas a enfeitar a distância
com aquele sorriso
com que me disseste adeus
derramei nas águas
a minha parte que te pertence
e fiquei a ver
do convés do meu navio
duas saudades
que se abraçavam
naquele fim de tarde
longo vermelho
e alheio ao tédio dos deuses


Soares Teixeira

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

"OLHAVAS-ME" - Soares Teixeira


Olhavas-me
como páginas de um livro
levadas pelo vento
quis desenhar uma flor
no rodapé
de um qualquer fragmento
de instante
desses
onde te espelhavas
mas o meu sorriso
nunca conseguiu
alcançar as asas
com que me enfeitiçavas
hoje
recordar-me de ti
é olhar para um rio longínquo
onde cintila a luz
de um sol ao entardecer
sim
ainda me fazes
libertar um sorriso
mas já sem asas
um sorriso
no canto de uma página
de acaso
que se mistura
com as outras folhas
que um dia habitaram
a árvore
onde um dia pousaste
a árvore
que sempre fui
sou e serei


Soares Teixeira

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

"DE BRAÇOS ESTENDIDOS" - Soares Teixeira


De braços estendidos
as nossas mãos sustinham a hora futura
sonhada por um deus ávido de humanidade
e assim caminhámos um ao encontro do outro
e assim nos recebemos
e assim fomos o sagrado sonho de uma divindade


Soares Teixeira

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

"NAQUELE TEMPO DE AMOR" - Soares Teixeira


Nos andaimes
daquele tempo
onde
como obreiros
tínhamos os corpos suados
de tanto esculpirmos
as colunas do amor
foste a linha
fui o linho
foste a vinha
fui o vinho
Naquele tempo
sem futuro
flutuávamos
puro presente
pérolas a rolar
em céus a começar
Naquele tempo
sem antes
nem depois
éramos apenas um
um rio
um astro
um amanhecer
apenas um
aquele
e mais nenhum
uma ilha
um veleiro
uma viagem
Nos andaimes
daquele tempo
obreiros do amor
perdidamente perdidos
como pérolas a rolar
nas folhas de uma videira
nas flores de uma amendoeira
nos ramos de uma trepadeira
éramos novos céus
dentro de uma ânfora
de carne a cintilar
Naquele tempo
sem tempo
em que esculpíamos colunas
éramos excesso a respirar
todos os mapas do nosso olhar
Naquele tempo
os nossos corpos suados
eram água a jorrar do vento
seara a crescer no mar
Nos andaimes
daquele tempo
de corpos suados
clarões à cintura
e forjas no olhar
éramos diligentes mestres
e ávidos aprendizes
do cósmico, mágico
peregrino e solar
ofício do amor



Soares Teixeira

domingo, 15 de janeiro de 2012