Nesta pintura de
Henri Matisse existe algo de primordial, quase sagrado. Estas mulheres em celebração evocam antigos rituais dum tempo de lendas e mitos em que os corpos pareciam florescer da terra numa nudez abençoada. Parecem estar no primeiro dia de si mesmas; criaturas recém-criadas ainda cor de barro, vindas de um céu de azul profundo que envolve um mundo de fantástico verde. A simplicidade do quadro: três cores, o circulo formado pelos braços das mulheres, a curvatura da terra e as curvas dos corpos, enfatiza todo o simbolismo e toda a dinâmica do instante. É um quadro quase fotográfico onde tudo se resume ao essencial, mas que entanto nos oferece qualquer coisa. Essa oferta é um lugar, e esse lugar está entre aquelas duas mulheres que não têm as mãos unidas, que quebram o círculo. Somos convidados a paricipar na dança, no ritual, na celebração, para que o círculo se complete, para que a unidade seja alcançada. Nesta dança que nos sacode o espírito quase podemos adivinhar uma diagonal entre o canto inferior esquerdo (por onde dá a sensação que somos convidados a entrar) e o canto superior direito (onde se pode adivinhar um observador para lá do quadro).
Olhando com atenção para este quadro o tempo torna-se subitamente jovem até quase deixar de existir e somos sacudidos pelo alvoroço de um Mistério nos observa, nos chama, e nos dança no peito.
Soares Teixeira